Sou um leão corporativo
misturo meus dias com doses
homeopáticas
de silício, concreto e freon
sou urbano
e a pressão que me domina
é forte e tentadora
bom, a endorfina também
a vida se tornou um incêndio apaziguado
e no espelho repito pra mim mesmo
não há razão para desespero
não há razão para desespero
nos bares de sempre
nas garrafas de sempre
o tempo se afoga lentamente
perco sentidos e noções
e volto pra casa
falsamente satisfeito
a velha falsa sensação de satisfação
e o velho sentimento de controle
da situação
e digo para o espelho
seu fígado não é de borracha
seu fígado não é de borracha
meus olhos são profundos
quase inexistentes
talvez sejam infinitos
e eu nem perceba
só consigo enxergar a tristeza
dentro deles
sempre marejados
calejados
fustigados pela fumaça urbana
e pela bizarra intolerância humana
e converso baixinho com o espelho
preciso mudar o mundo
preciso mudar o mundo
os dias passam nublados
e tenho sempre a sensação de nunca chegar a lugar algum
percorro asfaltos e calçadas
becos e vielas
atrás de respostas que sei que não vou encontrar
pelo menos não onde procuro
e em casa, após o ralo jantar
enfrento o espelho que nunca me responde
a rua é uma amargura
a rua é uma amargura
são ilusões atrás de ilusões
quebram-se as caras
as coroas e as mazelas
os padrões e os preconceitos
jazem milhares de primaveras
nessa atmosfera inerte e imprecisa
o tempo pára
e resta o espelho, que me olha de soslaio
enquanto vejo minha face refletida
com a barba já grossa, por fazer
e os olhos fundos da noite insone
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