13.4.10

Dor que não há

te espero mesmo enquanto
a lágrima escorre aqui
no canto
que não queima
nem dói
pranto sem sofredor
qual dia qual data
não sabe quando
se onde estiver
eu tiver sede
a sede da sua imagem
eu mato com a água
que verte da minha verdade

mas também não ligo
porque já estou no nosso verão
tarda a noite delonga o dia
e fico aqui a te espiar
dentre recortes remanescentes
marcas então frequentes
sonhos recorrentes
te vejo e não me esqueço
e assim eu luto em vida
e nesta lida serena
apaixonado permaneço

Antônimos anônimos

na cabeça uma idéia
fixa
na idéia um descompasso
fixo

eu nem sei mais o que dizer
sem dúvida
nem a perda nos consola
sem dádiva
somente o sol se ilumina
ilúdica
e a noite a sombra predomina
intacta

no semblante uma tormenta
atônita
na tormenta um holofote
atônito

.

6.4.10

Pêndulo 11

o desafeto
interrompe o andamento
e todo o chão se abre
os pés se perdem
acaba a monotonia
quem sabe um pedido se socorro
e a situação
vira ironia?

.

Tadinha da poesia

E estava lá
a poesia
precisando ser lida
mas ninguém se manifestou
decerto que ninguém sabia
daquela poesia
que estava lá
e não se lia

E perdeu a magia
e foi ficando aflita
porque ninguém
manifestava
ninguém a lia
ninguém sabia

Era uma poesia
e ninguém sabia
tinha cara de prosa
e jeito de samba
tinha até melodia
mas era um gesto
uma poesia

E ficou lá
esperando a visita
de um alguém que a lesse
que a visse
e que soubesse que ela existia
que era uma poesia
algo que só nela havia
uma coisa incerta, cara e repleta
de poesia

Veja você

perfeito
preconceito
onde está o defeito?

cansaço
espaço
onde está o atraso?

sossego
desapego
onde está o pelego ?

besteira
maneira
onde está a coceira?

apuro
seguro
irmão, onde estará o futuro?

.

Poderio

nada para a procissão
nem os carros
nem a fumaça de seus escapamentos
nem a viagem marcada
nem a chuva graúda
nem mesmo os marimbondos
nem o evento político
ou o discurso apropriado
nem mesmo a produção de aguardente
nada para a procissão

nada para a reza
nem o futuro
nem o pano de fundo
nem mesmo a confissão
nem a viatura policial
nem as alegorias carnavalescas
nem mesmo o silêncio
ou o som da respiração
nem o coito do adultério
nada para a reza

nada para a interrupção
nem mesmo a reza
nem mesmo a procissão

para tudo
só o fim

.

1.4.10

Tragam-me

tragam-me as palavras
aquelas que não fazem falta
porém delas tenho medo
pugentes, pedradas
soam como soa a água maligna
deste mar que não se revolve

tragam-me os benefícios
e eles tragam devagar
injetam seu tempero murcho
no meu corpo semi-cerrado
onde nada encontram
apenas um diagrama sem nexo

tragam-me os pedidos de desculpas
que não vejo de onde vem
consomem o que há de novo
perpetuam carnes e meditações
inércia paralela e imputável
crescem sem se ver

tragam-me os dias
tragam-me as horas
tragam-me meu desejo de sobreviver
tragam-me minha vontade de voar
e nunca devolvem

.
(inspirado no comentário do amigo Auíri)